Cerca de 42 políticos e seus familiares de primeiro grau são titulares de fazendas que ficam dentro de terras indígenas.

É o que denunciou nesta quarta-feira (14), a segunda parte do dossiê Os invasores, elaborado pelo observatório De Olho nos Ruralistas.

Essas fazendas constituem uma irregularidade do ponto de vista legal.

Além de ameaça os direitos constitucionais de povos originários que ali vivem.

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O documento foi lançado no Cine Petra Belas Artes, em São Paulo, acompanhado de debate sobre a temática.

Além disso, houve a exibição do premiado documentário Vento na fronteira, que retrata um conflito entre fazendeiros e indígenas guarani kaiowá na fronteira entre Brasil e Paraguai.

Dossiê

A primeira parte do relatório foi divulgada durante o Abril Indígena, mês em que se procura dar maior projeção para as inúmeras lutas da causa indígena em todo o país.

No documento já se havia informado a identificação de 1.692 sobreposições, das quais se destaca agora a porção pelas quais respondem clãs políticos. 

O observatório detectou terras com sobreposição a partir da análise de dados fundiários do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), mais especificamente, das bases do Sistema de Gestão Fundiária (Sigef), do Sistema Nacional de Cadastro Rural (SNCR) e do Sistema Nacional de Certificação de Imóveis (SNCI).

Os políticos e sua rede têm em suas mãos 96 mil hectares, o equivalente à soma das áreas urbanas de Rio de Janeiro e Belo Horizonte. 

Com 17 casos, Mato Grosso do Sul lidera a lista.

Em seguida, aparecem Mato Grosso e Maranhão, com sete, cada.

Guarani kaiowá e indígenas isolados

Entre os nomes que aparecem em destaque com a divulgação do relatório estão o senador Jaime Bagattoli (PL-RO) e o deputado federal Dilceu Sperafico (PP-PR).

Bagattoli integra, atualmente, a Comissão de Meio Ambiente, a Comissão de Agricultura e Reforma Agrária e a Comissão Parlamentar de Inquérito das Organizações Não Governamentais – ONGs.

Sperafico é membro da Comissão de Agricultura, Pecuária, Abastecimento e Desenvolvimento Rural, na Câmara dos Deputados.

Ele publicou um vídeo, em sua conta no Instagram, comemorando a aprovação do Projeto de Lei 490/2007 na Câmara, que contou com seu voto favorável.

No vídeo, ele justificou o voto, dizendo que proprietários rurais têm tido suas fazendas ameaçadas por processos de demarcação “indevida” de terras indígenas, em Mato Grosso do Sul e no Paraná.

E é justamente em Mato Grosso do Sul – estado com fama de violência no campo e assassinatos de indígenas, documentados por entidades como a Comissão Pastoral da Terra (CPT) e o Conselho Indigenista Missionário (Cimi) – onde Sperafico tem uma fazenda, a Maracay, no município de Amambai.

A propriedade de que é dono tem mais de quatro mil hectares, de acordo com o observatório De Olho nos Ruralistas, e fica sobre a Terra Indígena Iguatemipeguá, dos guarani kaiowá.

No caso de Bagattoli, a fazenda em situação irregular é a São José, que fica no município de Corumbiara, em Rondônia.

A porção que está sobreposta é de 2,5 mil hectares em relação à Terra Indígena Rio Omerê, local habitado pelos povos akuntsu e kanoê, que vivem em isolamento voluntário. 

O patrimônio declarado por Jaime Bagattoli ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE), que inclui diversos lotes rurais, ultrapassa R$ 55 milhões. O de Sperafico supera R$ 46 milhões.

Invasores de territórios de povos originários também foram os responsáveis por bancar 29 campanhas de candidatos à eleição ou reeleição à Presidência da República, ao Congresso Nacional, a governos estaduais e assembleias legislativas. O montante de doações ultrapassou R$ 5,3 milhões.

Considerando somente pessoas ligadas à Frente Parlamentar da Agropecuária, o que se observa é que 18 integrantes receberam R$ 3,6 milhões em doações de campanha, desembolsados por fazendeiros ligados a sobreposições. 

Sem resposta

O deputado federal Dilceu Sperafico e o senador Jaime Bagattoli não responderam os questionamentos da reportagem.

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