Movimentos sociais e organizações ambientais e de direitos humanos do Estado do Tocantins se uniram em uma carta aberta ao Ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, expressando forte oposição ao Projeto de Lei nº 1.199/2023, que propõe a transferência das terras públicas da União para o domínio do Estado do Tocantins.

A advogada, Fátima Dourado, representante da Coalizão Vozes do Tocantins, um dos movimentos responsáveis pela carta, em entrevista ao Portal Norte, destacou que a proposta, de autoria do Senador Eduardo Gomes, enfrenta resistência devido às preocupações com a gestão inadequada e os potenciais impactos negativos sobre o meio ambiente, os povos indígenas, quilombolas e comunidades tradicionais, bem como sobre a política de reforma agrária.

A carta enviada ao Ministro ressalta diversos pontos críticos, destacando que a proposta contraria princípios constitucionais relacionados à função social da propriedade rural e à destinação das terras públicas. Além disso, aponta problemas graves na gestão fundiária do Estado do Tocantins, como a emissão irregular de títulos sobre áreas da União Federal e a falta de transparência e eficácia na regularização fundiária.

Destaca-se ainda na carta a preocupação com a fragilização das lutas sociais e ambientais caso o PL 1199/2023 seja aprovado, evidenciando a ausência de compromisso do Governo do Estado com a preservação do meio ambiente e com a política de reforma agrária.

A carta foi assinada por uma ampla gama de organizações, incluindo o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), o Conselho Indigenista Missionário (CIMI), a Comissão Pastoral da Terra (CPT) e diversas outras entidades representativas, demonstrando a união e a força do movimento contrário ao projeto.

Destaques da entrevista:

O que é a Coalizão Vozes do Tocantins?

“A coalizão Vozes do Tocantins por Justiça Climática é uma organização que integra aproximadamente 15 organizações aqui do estado do Tocantins. Ela foi criada há mais de dois anos com o objetivo de debater as questões relacionadas à preservação ao meio ambiente, à defesa dos direitos, das comunidades tradicionais, das comunidades quilombolas, ribeirinhos, indígenas e trabalhadores rurais”, pontua Fátima Dourado.

Preocupações constitucionais e de gestão estadual

Fátima Dourado, destacou a preocupação constitucional com a proposta.

“Olha, a Constituição Federal, ela determina, ela tem um capítulo próprio que trata da política agrária, da política agrícola aqui no Brasil e o artigo 188, ele preconiza que a destinação das terras públicas devolutas, elas têm que ser compatibilizadas com a política agrícola e com o plano nacional de reforma agrária. Então, a grande preocupação hoje dos movimentos sociais aqui de Tocantins, é que a PL proposta no Senado, ela não prevê o plano nacional de reforma agrária, ela não prevê como que vai ser utilizado aqui no estado Tocantins, porque não existe nem sequer um planejamento, né?”

Ela também ressaltou a necessidade de melhorias na gestão estadual.

“A grande preocupação hoje nossa, enquanto movimento social, é que o estado do Tocantins, ele tem que ter um plano de gestão e é um dos órgãos que são responsáveis pela regularização. Caso aqui é o Intertins, tem que melhorar os órgãos de controles ambientais, no caso do naturatins, que são órgãos que estão sucateados, que há uma carência de gestão na área humana, na área administrativa.”

Desafios e conflitos no campo

Fátima também abordou os desafios enfrentados pelas comunidades quilombolas.

“Então assim, para o Estado requerer a gestão das terras públicas federais, primeiro ele tem que organizar a gestão estadual, também a preocupação que nós temos, é que essa falta de organizações e de planejamento ela pode ocasionar uma série de outros problemas. Hoje nós estamos sofrendo aqui no estado do Tocantins, já com os conflitos agrários.”

Ela destacou a situação das comunidades quilombolas, mencionando o caso da comunidade Rio Preto.

“Tocantins possui cinquenta comunidades quilombolas, apenas uma possui o registro, né, a titularidade coletiva de suas terras. Então há uma carência também da própria legislação que regularmente a regularização dos territórios quilombolas, aqui no Tocantins, há uma grilagem de terras sobre esses territórios, a exemplo a comunidade do Rio Preto, que no ano passado teve várias famílias que teve suas casas invadidas, queimadas por parte de grileiros.”