O Dia da Amazônia é celebrado neste dia 5 de setembro, mas diante de tantos ataques, aumento de queimadas e de desmatamento, o que de fato há para comemorar? Políticas ambientais responsáveis e conscientização seguem como desafios para o futuro da região.

O Portal Norte de Notícias conversou com alguns especialistas no assunto, que falaram sobre como veem a realidade atual e o que se pode esperar mais a frente.

O pesquisador titular do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa) e doutor pelo Departamento de Ecologia e Biologia Evolucionária da Universidade de Michigan (EUA), Philip Martin Fearnside, demonstra pessimismo diante da realidade.

“Estamos em um momento de extremo retrocesso na atuação do governo nessa área, com os órgãos ambientais sendo desmontados pelo executivo, e com o legislativo acelerando a tramitação e aprovando um enorme leque de projetos de lei danosos ao ambiente na Amazônia”, disse Philip.

Segundo ele, o que se pode celebrar é justamente o fato de que mais pessoas estão reconhecendo a gravidade dos problemas ambientais na Amazônia. Hoje, as pessoas estão mais preocupadas com a degradação desenfreada do meio ambiente.

Philip Martin alerta que o Pará provavelmente será novamente o Estado campeão em área desmatada, mas ele chama atenção para o Amazonas, que pode ser o campeão em termos da velocidade de aumento da taxa de desmatamento.

“O desmatamento no Amazonas é concentrado no sul do estado, em Apuí, Matupí, Lábrea e Boca do Acre. Esta geografia de desmatamento pode mudar no futuro devido aos planos para construção de estradas abrindo vastas áreas para a entrada de desmatadores, a BR-319 e as suas estradas laterais sendo as principais ameaças”.

Essas áreas citadas por Philip ganharam apoio através  de um Plano de Prevenção e Controle do Desmatamento e Queimadas do Amazonas (PPCDQ-AM), por parte do governo do Amazonas. Esse projeto também criou a Operação Tamoiotatá, que tem o objetivo de reduzir desmatamento e queimadas no Sul do Estado.

Ruim, mas vale comemorar

A gerente de Ciências do WWF-Brasil, Mariana Napolitano, cita que mesmo com os altos índices de desmatamento e de queimadas na Amazônia, ainda há motivos de comemoração.

“O que nós podemos de fato celebrar são os modelos que funcionam no bioma. Como, por exemplo, as terras indígenas que são umas das áreas mais preservadas e que mantêm os valores dessas culturas, além de reservas extrativistas e de desenvolvimento sustentável. Ou seja, modelos que convergem a conservação da biodiversidade e a manutenção dos meios de vida das populações tradicionais. Acredito que esses são os motivos de celebração, apesar dessas áreas também estarem ameaçadas”, explica Mariana.

Realidade

Os principais problemas enfrentados na Amazônia ultimamente são o aumento do desmatamento, a fragmentação e a degradação por conta das queimadas. O que interfere diretamente na biodiversidade, nos recursos hídricos e na capacidade da floresta de se autorregular.

A gerente de Ciências do WWF-Brasil conta que no último mês (de 1º a 31 de agosto) foram registrados 28.060 focos de incêndios na Amazônia.

“Desde o início do governo Bolsonaro, os números de queimadas são mais altos que nos anos anteriores. Isoladamente, o mês de agosto traz uma quantidade de focos mais baixa que nos dois anos anteriores, que foram recordes de queimadas. É importante ressaltar que há três anos, o mês de agosto tem batido recorde em queimadas no Estado do Amazonas” explana Mariana. 

Desafios

Para Philip Martin, o maior desafio é de conter o desmatamento e a degradação da floresta. Ele explica que se não for contido, há a possibilidade de passar de um “ponto de não retorno”.

Mariana Napolitano foca na vontade e empenho dos governantes. Ela diz que além dos desmatamentos e queimadas, um outro grande desafio é o de combater o crescimento do garimpo ilegal e dos conflitos sociais. 

Um estudo feito pela WWF-Brasil e Fiocruz estima que em 10 anos, o Brasil gastou quase R$ 1 bilhão com doenças respiratórias causadas pela fumaça das queimadas.

Os especialistas entrevistados são unânimes na afirmação de que o governo federal também faz parte dos desafios enfrentados pela Amazônia. Para eles, as políticas do governo atrapalham, de certa forma, a preservação do meio ambiente.

Para a gerente de Ciências do WWF-Brasil, o país vive um forte retrocesso ambiental, que está relacionado à falta de políticas públicas, redução da fiscalização e o aumento das atividades ilegais.

“É nítido que estamos em meio a um projeto intencional de desmonte ambiental. Esse pode ser considerado o mais desastroso governo da história da política ambiental do Brasil”, disse.

O pesquisador do Inpa afirma que no atual governo há um efeito combinado de ações concretas em mudar normas de forma a atrapalhar a fiscalização e outras atividades dos órgãos ambientais.

“O discurso constante antiambiental que passa uma mensagem aos que pretendem violar as leis e regulamentos ambientais no sentido de que podem violar as leis e depois serão perdoados. Este quadro não é fácil de reverter, como demostrado em 2020 quando foi decretada uma proibição de queimadas durante 120 dias, mas houve queimadas recordes mesmo mandando o Exército para tentar controlar”, disse Martin.

Futuro

Quem sofre de forma imediata com a degradação da Amazônia são a fauna e a flora, mas, segundo Mariana, a médio e longo prazo a população também é afetada.

“Há ainda os impactos indiretos, como a sobrecarga no Sistema Único de Saúde que é afetado pelo aumento da incidência de doenças respiratórias”, informa a gerente.

Philip Martin teme que se nada for feito, os danos aumentem ao longo das décadas de forma que nem governos futuros consigam reverter problemas causados desde agora.

Reprodução – Pesquisadores Philip Martin Fearnside e Mariana Napolitano