O Ministério Público Federal (MPF) propôs uma ação civil pública em 14 de novembro de 2024 para impedir que o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) analise ou emita licenças ambientais para a repavimentação do trecho central da rodovia BR-319, que liga Manaus (AM) a Porto Velho (RO).

A ação pede que isso só ocorra após a realização da consulta prévia, livre e informada às comunidades indígenas e tradicionais afetadas, conforme previsto na Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT). Caso o pedido não seja cumprido, o MPF solicita multa diária.

Direito à consulta e mapeamento

O MPF destaca que o direito à consulta é previsto pela Convenção 169 da OIT, mas não foi respeitado pelo Ibama e outros órgãos responsáveis até agora.

O órgão exige que o Ibama, a União e o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) apresentem um plano para mapear as comunidades tradicionais.

Esse mapeamento deve abranger, no mínimo, as comunidades localizadas a 40 km da rodovia. O objetivo é proteger os modos de vida dessas populações.

Além disso, após o mapeamento, solicita que a União, o ICMBio e a Fundação Nacional do Índio (Funai) desenvolvam um plano de consulta com as comunidades afetadas, respeitando os protocolos de consulta previstos na Convenção 169 da OIT.

Impactos e omissão

Também argumenta que as autoridades responsáveis não consultaram as comunidades afetadas, especialmente as localizadas na região conhecida como “Amazônia Profunda”, durante os procedimentos administrativos.

Essa área é reconhecida como de especial proteção ambiental, com foco na preservação da floresta. Por conta disso, o MPF exige que a repavimentação do trecho central da rodovia BR-319 seja revista.

O órgão destaca que a degradação já é visível, com focos de calor registrados em 33 das 60 terras indígenas e 24 das 42 unidades de conservação monitoradas, em agosto de 2024. Isso afeta diretamente as comunidades locais.

Desde 2005, o Estado brasileiro tem falhado em garantir a consulta e proteção das comunidades indígenas e tradicionais afetadas pela obra.

O MPF enviou três recomendações ao longo dos anos, buscando uma solução mais rápida, sem recorrer ao Judiciário. No entanto, não obteve sucesso, o que levou à judicialização do caso.

Falhas nos estudos e defesas dos órgãos públicos

O Ibama e outros órgãos alegaram limitações de competência ou validade jurídica de suas ações. Além disso, as audiências públicas realizadas apresentaram irregularidades.

Os estudos de impacto ambiental não consideraram impactos adicionais como desmatamento e pressão fundiária. O Ibama, embora tenha reconhecido a importância de alinhar o Plano Básico Ambiental Indígena às necessidades das comunidades, recusou-se a realizar a consulta prévia e emitiu a Licença Prévia n. 672/2022, sem prever a consulta nos moldes da Convenção 169 da OIT.

A Funai também apontou falhas nos estudos de impacto e sugeriu ampliar a análise dos impactos cumulativos da obra nos territórios indígenas. No entanto, o Plano Básico Ambiental, concluído em 2024, não abrangeu todas as comunidades afetadas.

Proposta de solução e pedido de indenização

O MPF considera esse processo um caso estrutural, que envolve várias instituições. Por isso, propõe uma solução cooperativa para garantir a consulta prévia, com mediação judicial e cronogramas entre as partes.

Caso não haja resolução consensual, o órgão pede que o Judiciário declare a nulidade do Termo de Referência da Funai. Também requer a imposição de multa diária e o pagamento de R$ 20 milhões por danos morais coletivos, devido à omissão na realização da consulta.