A rotina da vida dos peixes amazônicos também é afetada devido ao efeito de eventos extremos como a seca e a cheia dos rios da região.

A confirmação veio por meio de uma pesquisa realizada no Amazonas, com apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do estado (Fapeam), divulgada nesta terça-feira (16).

O estudo constatou a redução da diversidade de peixes e aumento das espécies dominantes, em relação ao número total de indivíduos, nos períodos de cheia e vazante.

O estudo

A pesquisa intitulada “Composição de espécies e respostas biológicas ao longo do tempo: monitorando a fauna de peixes no Lago Catalão para entender o impacto de eventos hidrológicos drásticos” afirma que os eventos hidrológicos afetam toda a rotina de vida dos peixes amazônicos.

Conforme o estudo, a mudança no nível da água afeta o deslocamento entre ambientes, migrações do rio abaixo ou rio acima, acesso a alimentos e indicação de quando reproduzir. 

A coordenadora da pesquisa, doutora em Biologia de Água Doce e Pesca Interior, Cristhiana Paula Röpke, do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), explica que as análises começaram com as coletas mensais de peixes utilizando malhadeiras, previamente instaladas na borda da floresta inundada ou na área do lago por 24 horas.

Projeto de pesquisa recebe apoio da Fapeam - Foto: Acervo/Cristhiana Röpke
Projeto de pesquisa recebe apoio da Fapeam – Foto: Acervo/Cristhiana Röpke

Ela detalha, que logo após esse processo, todos os peixes foram armazenados em gelo e levados para o laboratório onde ocorre a posterior identificação e análise das espécies. 

Nessa etapa, são analisadas algumas características, como peso, comprimento, se é macho ou fêmea, idade (adulto ou jovem) e tipo de reprodução.

A pesquisadora afirma que todas as informações passaram a integrar um banco de dados, atualmente com 20 anos de informações, permitindo uma análise mais detalhada, a fim de compreender como as mudanças no ambiente afetaram a fauna dos peixes. 

“Especificamente sobre o efeito dos eventos extremos, nós encontramos que um número menor de fêmeas reproduz durante eventos de seca severa, a quantidade de ovos produzidos pelas fêmeas de algumas espécies também é menor do que o esperado para o tamanho delas durante esses eventos”, afirmou. 

A seca e os peixes

O período de seca afeta não somente a rotina de migração, alimentação, reprodução e crescimento, mas também aumentam as chances de que muitos peixes morram.

A temperatura da água aumenta muito e com isso há uma forte perda na quantidade de oxigênio e aumento na concentração de compostos que podem ser tóxicos. 

“Sob condições de estresse impostas pela seca, assim como em seres humanos, os peixes produzem uma alta quantidade de hormônios de estresse, que atuam diretamente no uso das reservas de energia (gordura que estava acumulada na barriga e na carne dos peixes) para sobrevivência, faltando energia para reproduzir”, complementou Cristhiana. 

Seca do Rio Negro na orla de Manaus- Foto: Gilmar Honorato/SGB
Seca do Rio Negro na orla de Manaus- Foto: Gilmar Honorato/SGB

Reprodução

A reprodução para essas espécies é muito sincronizada a um momento e a percepção de sinais ambientais, que indicam a hora de reproduzir, o que pode ser ‘bagunçado’ por uma enchente muito tardia.

Com isso, menos filhotes são produzidos, afetando diretamente os estoques de peixes para as pescarias por dois ou três anos.  

Os dados são necessários para dimensionar adequadamente o impacto de mudanças climáticas sobre a fauna de peixes da Amazônia. Muitas das informações geradas têm o potencial de melhorar políticas públicas relacionadas à gestão da pesca e conservação.  

Apoio à pesquisa

A pesquisadora destaca o apoio financeiro para execução do projeto de pesquisa e enfatiza a importância da continuidade e manutenção dos recursos.

“O apoio da Fapeam foi essencial, pois permitiu a complementação em dois anos de dados ao nosso monitoramento. Além das coletas, a Fundação permitiu a permanência de recursos humanos para realização das coletas e obtenção de dados em laboratório, por meio de uma bolsa de apoio técnico e dois bolsistas de mestrado”, destacou o pesquisador. 

Segundo Ropke, atualmente, uma das maiores limitações para a pesquisa na Amazônia é a permanência de recursos humanos nas atividades de pesquisa.