A histórica rivalidade entre os estados do Pará e Amazonas, frequentemente mencionada, remonta ao período colonial e carrega reflexos de eventos políticos e sociais que marcaram o Brasil. Entenda os detalhes da origem dessa “rixa” e como ela moldou a relação entre os dois vizinhos ao longo dos séculos.
Fábio Augusto, historiador e mestrando pela Universidade Federal do Amazonas (Ufam), aponta que o embate começou no século 18, quando o Amazonas ainda era conhecido como Capitania de São José do Rio Negro.
Naquela época, o território era subordinado política e economicamente à Capitania do Grão-Pará. Governadores paraenses, temendo perder influência regional, dificultavam o desenvolvimento do Rio Negro.
O século 19 trouxe mudanças, com elites locais e políticos paraenses, como João Batista de Figueiredo Tenreiro Aranha, liderando esforços pela emancipação do Amazonas.
Contudo, como lembra o historiador Robério Braga, a exclusão do Rio Negro da Assembleia Constituinte de 1823 prejudicou a autonomia política da região.
Isso aconteceu porque o governo paraense reteve o ofício de convocação para a participação do Amazonas, impedindo que a capitania fosse reconhecida como uma província independente na Constituição do Império.
Braga ressalta outro marco na relação conturbada: o anúncio da Independência do Brasil, proclamada em 1822, só chegou ao Amazonas em novembro de 1823, mais de um ano depois. Segundo ele, o atraso ocorreu porque o Pará reteve a informação em Belém.
Rixa na imprensa
Uma evidência dessa disputa está em alguns jornais datados das décadas de ’60 e ’70, como explica Fabio.
“Encontramos em jornais, principalmente entre as décadas de 1960 e 1970, charges que, hoje, renderiam processos gigantescos contra seus autores. Lembro de uma, publicada pelo extinto ‘A Notícia’, de Manaus, em 1969, intitulada ‘Presente de Paraense’. Nela vemos um avião lançando sobre a cidade uma sacola com alguns paraenses trajados como ladrões, representando o clássico estereótipo de que nossos vizinhos são fora da lei”, conta.
Fronteiras fechadas na crise de 1856
A rivalidade também ficou evidente durante a epidemia de cólera morbus em 1856, quando o Pará fechou suas fronteiras para evitar a entrada de amazonenses.
Apesar disso, profissionais de saúde, como o médico David Canavarro, trabalharam na linha de frente do combate à doença, em um paralelo com a atuação de paraenses nos hospitais de Manaus durante a pandemia de Covid-19.
Robério Braga destaca que a colaboração entre os estados também é significativa: o Amazonas possui forte influência paraense em sua população e história. Ele cita que Manaus abriga cerca de 300 mil paraenses e que o estado já teve governadores nascidos no Pará, como Wilson Lima e Eduardo Braga.
Relações culturais
Embora as disputas sejam recorrentes, Fábio Augusto observa que, entre os séculos 19 e 20, a relação entre as sociedades paraense e amazonense era mais harmoniosa, com jornais celebrando eventos e trocando felicitações.
O historiador também lembra que até hoje existem homenagens que reforçam laços culturais e históricos entre os estados.
*Com informações de Agência Cenarium e RealTime1.