No momento em que o uso de drogas está na pauta do Congresso e do Judiciário, é de se perguntar sobre referências científicas sobre o assunto.
Pois o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro censurou um importante estudo sobre o uso de drogas no Brasil. O então ministro da Cidadania, Osmar Terra, desacreditou uma pesquisa realizada pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) por discordar dos seus resultados.
A Secretaria Nacional de Políticas Sobre Drogas, do Ministério da Justiça (Senad), encomendou a pesquisa, por meio de edital. A Fiocruz, vencedora do certame, ouviu 16 mil pessoas em todo o país, entre os anos de 2014 e 2017.
O esforço envolveu mais de 500 profissionais de diferentes áreas: entrevistadores de campo, pesquisadores da área de epidemiologia e estatística.
O orçamento para fazer o estudo chamado “Terceiro levantamento nacional sobre o uso de drogas pela população brasileira” era de R$ 8 milhões. A Fiocruz informou que gastou R$ 7 milhões e devolveu ao governo R$ 1 milhão.
Contestação
Osmar Terra não gostou do retrato levantado pela pesquisa. Em entrevista à Globonews, realizada em maio de 2017, ele colocou em xeque a credibilidade da instituição.
“A Fiocruz tem o viés de defender a liberação das drogas, a Fiocruz trabalha há muitos anos para provar que não é problema o consumo de drogas. A Fiocruz tem um papel extraordinário nas pesquisas sobre vacinas, sobre medicamentos, mas infelizmente na área de pesquisa sobre drogas é um grupo totalmente comprometido com a liberação, que quer mostrar que não tem epidemia”, disse.
A professora Andrea Gallassi, coordenadora do Centro de Referência sobre Drogas da Universidade de Brasília, discordou de Terra. Ela defendeu que a Fiocruz realizou o estudo seguindo rigorosamente normas científicas e que a censura atrapalhava a elaboração de políticas públicas.
Não vivemos uma epidemia do uso de drogas, tivemos um pequeno aumento do uso de álcool, a partir dos dados dessa pesquisa. O que tem hoje, então, é um cenário de uso que não surpreende a comunidade científica, uma vez que é um cenário mais ou menos esperado e, portanto, não tem por que, não existe razão, a não ser uma razão ideológica do governo, em negar a divulgação desses dados, sendo que foi uma pesquisa contratada por uma instituição e paga com recurso público”, afirmou.
Terceiro levantamento nacional sobre o uso de drogas pela população brasileira
Após entendimento selado no âmbito da Câmara de Conciliação e Arbitragem da Administração Pública Federal, um órgão da Advocacia Geral da União (AGU), a pesquisa foi liberada ao público, em agosto de 2019.
No repositório da Fiocruz é possível acessar o estudo em português, inglês e espanhol.