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Checagem: Vídeo de universitário sendo hostilizado por usar camisa de Bolsonaro é de 2016

Projeto Comprova - Foto: Reprodução

Projeto Comprova - Foto: Reprodução

Um vídeo verdadeiro de um homem sendo hostilizado por estudantes na Universidade Federal do Ceará (UFC) por usar uma camiseta com a imagem do presidente Jair Bolsonaro (PL) foi usado em uma publicação no Twitter considerada enganosa pelo Comprova.

Nos comentários ao post, usuários reclamam sobre a cobertura expressiva da imprensa sobre o caso dos ataques de apoiadores de Bolsonaro a Gilberto Gil na Copa do Mundo do Catar, em detrimento da cobertura sobre o caso do estudante da UFC.

No entanto, a situação mostrada no vídeo ocorreu em 2016, por isso não há notícias recentes sobre ela.

Conteúdo investigadoVídeo mostra um homem sendo hostilizado por estudantes dentro da Universidade Federal do Ceará (UFC) por, supostamente, vestir uma camisa com uma imagem do presidente Jair Bolsonaro (PL). O conteúdo é acompanhado do texto: “Esses são os mesmos que pedem respeito ao Gilberto Gil!”.

Onde foi publicado: Twitter.

Conclusão do Comprova: É enganoso post de um vídeo que mostra um homem sendo hostilizado por estudantes da Universidade Federal do Ceará (UFC) por vestir uma camiseta com uma imagem de Bolsonaro.

Apesar da gravação ser verdadeira, a publicação dá a entender que o caso teria ocorrido recentemente, ao dizer que “esses são os mesmos que pedem respeito ao Gilberto Gil”, fazendo referência à hostilidade sofrida pelo cantor na Copa do Mundo do Catar, no dia 24 de novembro.

Na verdade, o episódio ocorreu em maio de 2016, quando Jorge Fontenelle, então estudante de Letras da UFC e policial civil, foi atacado por outros alunos.

Fontenelle afirmou ao Comprova que não iniciou a discussão ou sequer agrediu verbalmente pessoas do grupo que o cercou.

versão do policial civil foi contestada, à época, pelos estudantes da universidade, que alegavam que Fontenelle teria feito provocações verbais, inflando o protesto contra ele.

Fontenelle procurou o centro acadêmico da UFC e a Polícia Civil do Ceará para fazer denúncia sobre os ataques.

Conforme a universidade, foram abertas duas sindicâncias para apurar o ocorrido, que tramitaram regularmente e com procedimentos legais cumpridos. Ambas foram arquivadas por falta de provas.

Enganoso, para o Comprova, é todo conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Como diversos usuários comentaram reclamando sobre a falta de cobertura da imprensa e de posicionamentos de políticos a respeito do caso, o Comprova decidiu investigar o contexto e origem do vídeo, gravado, na verdade, em 2016.

Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos com maior alcance nas redes sociais. Até o dia 1º de dezembro, a publicação teve 417,9 mil visualizações; 12,9 mil retuítes; 44,3 mil curtidas e 1.968 comentários.

O que diz o responsável pela publicação: Procurado pelo Comprova, por meio de mensagem no Instagram, Pedro Poncio informou que, em momento algum, a publicação deu a entender que o vídeo é recente, até porque, segundo ele, “independente de quando foi não muda os fatos”.

Ainda de acordo com Poncio, o vídeo publicado por ele não está fora de contexto e retrata que “a esquerda pede respeito ao Gilberto Gil, quando, na verdade, sobrevive de hostilidade a qualquer que tenha um posicionamento diferente deles”.

Nas redes sociais, Poncio, que se apresenta como cristão, teólogo e conservador, afirma já ter sido membro do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST).

Em setembro deste ano, o MST denunciou Poncio por propagar conteúdos falsos sobre o movimento em material de campanha da então candidata a deputada federal Bia Kicis (PL-RJ) e afirmou que ele “nunca pertenceu ao movimento”.

Outras postagens de Pedro Poncio já foram alvos de verificação de veículos como o Estadão Verifica.

Como verificamos: Primeiramente, por meio da busca do Google, procuramos pela expressão “estudante hostilizado na UFC; camisa do Bolsonaro”, onde encontramos informações veiculadas pela imprensa da época em que o fato aconteceu (jornal O Povo e UOL).

A partir das notícias, o Comprova conseguiu comparar as fotos utilizadas pelos veículos com as imagens do vídeo investigado e encontrar correspondências (o homem tinha cabelos grisalhos e óculos e usava uma camiseta amarela com uma forma quadrada no centro).

Também por meio das reportagens encontramos o nome do homem que aparece sendo atacado: Jorge Fontenelle. Ao contatá-lo, Fontenelle confirmou ao Comprova que é ele na gravação.

Por fim, procuramos a assessoria de imprensa da Universidade Federal do Ceará e a Polícia Civil do Ceará.

Versão do homem que foi alvo das ofensas

Jorge Fontenelle é policial civil e professor, tem 46 anos, e em maio de 2016, quando o vídeo foi filmado, tinha 40 anos. Ele narrou ao Comprova que cursava Letras com opção de curso de italiano na Universidade Federal do Ceará.

Fontenelle diz que foi vítima de estudantes da esquerda, que militam no ambiente acadêmico.

“Eu me identificava com o pensamento do presidente Bolsonaro, que na época era deputado federal. A perseguição à minha pessoa já vinha de outros momentos, pois não simpatizava com a forma como determinados grupos se comportavam contra quem não tinha a mesma linha de pensamento deles”, disse Fontenelle.

Fontenelle confirmou que foi à Universidade Federal do Ceará por volta das 14 horas do dia 9 de maio de 2016 usando uma camisa que tinha o nome e a foto do atual presidente que, na época, era deputado federal.

“No Bosque Moreira Campos, eu estava fumando ao ar livre quando alguns estudantes chegaram perto de mim e começaram a me xingar com palavrões ofendendo minha honra. Disseram ainda que eu não era digno de estar ali pelo tipo de apoio e pensamento que eu demonstrava com aquela roupa”, explicou.

Fontenelle garantiu ao Comprova que não iniciou a discussão ou sequer agrediu verbalmente pessoas do grupo que o cercou. Ele disse que ficou nervoso no momento e tentou filmar com o próprio celular as cenas que ocorreram a partir dali.

“Uns perguntaram se eu estava louco por estar com aquela camisa. Outros disseram pra eu tirar a camisa se quisesse permanecer por lá. Eu me neguei a atender tais pedidos e as ofensas continuaram”, revelou.

Ele declarou ao Comprova que procurou o centro acadêmico da instituição para fazer denúncia sobre os ataques e, ao retornar do local, vários estudantes o cercaram e foi quando teve início outra série de agressões verbais e até físicas, segundo ele.

Fontenelle afirmou que no mesmo dia, depois da confusão, pouco depois das 17 horas, procurou o 24º Distrito Policial em Fortaleza para registrar denúncia contra pessoas identificadas por ele e que promoveram a série de ataques na instituição. O Comprova solicitou o documento à Polícia Civil do Ceará, mas não houve retorno até o fechamento desta verificação.

Posição da UFC

A Universidade Federal do Ceará confirmou ao Comprova, por meio de nota, que o fato envolvendo o estudante ocorreu em maio de 2016. Na época, a UFC diz que se manifestou oficialmente pela instauração do bom senso, convivência pacífica e democracia.

Segundo a instituição, foram abertas duas sindicâncias para apurar o ocorrido, que tramitaram regularmente e com procedimentos legais cumpridos. Ambas foram arquivadas por falta de provas.

A UFC concluiu a nota informando que não consta na instituição nenhuma formalização posterior, por parte do aluno, de suposto mau tratamento no ambiente acadêmico.

Em maio de 2016, a UFC também publicou nota sobre o assunto no portal da universidade.

Apoio de Bolsonaro

Na época, segundo reportagem do jornal O Povo, Bolsonaro gravou um vídeo em apoio a Fontenelle. Na gravação, o então deputado dizia estar chateado com o episódio, falou sobre intolerância e prometeu fazer grande evento em Fortaleza.

“Fiquei muito chateado com o que aconteceu, a intolerância por parte dessas pessoas que pregam o ódio de verdade. Deveriam buscar o diálogo contigo, e não na agressão, na cusparada, que parece que virou moda da esquerda derrotada do nosso país”, disse Bolsonaro.

Pós-denúncias

Ao Comprova, Fontenelle informou que recorreu contra a decisão do processo administrativo instaurado pela universidade contra os estudantes, pedindo para que fosse revisada a pena e a ausência de punição contra os responsáveis pelas agressões.

Fontenelle disse que abandonou o curso meses depois do episódio, pois diz ter sido vítima permanente de preconceito por diferentes estudantes da UFC.

Por que investigamos: O Comprova investiga conteúdos suspeitos que viralizam nas redes sociais sobre pandemia, políticas públicas do governo federal e peças que questionam o resultado das eleições presidenciais.

O post verificado, ao descontextualizar uma situação envolvendo o nome do atual presidente do Brasil, pode manipular a opinião pública e gerar danos à democracia.

Outras checagens sobre o tema: Em outubro de 2018, o jornal O Povo publicou uma matéria afirmando que, apesar de o vídeo ser verdadeiro, estava sendo compartilhado fora de contexto.

Em relação a outros materiais envolvendo Jair Bolsonaro, o Comprova mostrou que Richarlison não dedicou gols a ele em jogo contra a Sérvia; que é falso que Holanda, Índia e Rússia tenham oferecido apoio militar ao presidente; e que Bolsonaro não fez “Carta à Nação” para respaldar manifestações, ao contrário do que afirma vídeo.

Comprova +Redações

O Portal Norte participa do Projeto Comprova.

projeto Comprova +Redações é uma iniciativa da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) apoiada pela Embaixada e Consulados dos Estados Unidos. A ação viabiliza a participação de jornalistas de seis veículos de comunicação do país.

O projeto busca, de uma forma objetiva e apartidária, aumentar a capacidade das organizações participantes de avaliar e publicar informação verificada, além de expandir o alcance do projeto a diferentes partes do país.

Os temas do projeto podem incluir assuntos como a pandemia, políticas públicas e informações relacionadas às eleições presidenciais de 2022.

As seis organizações foram selecionadas a partir de indicações das principais associações de empresas jornalísticas e validadas pelos atuais 33 membros do Comprova.

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