O Ministério Público de São Paulo (MP-SP) abriu um inquérito para investigar o Hospital São Camilo, em São Paulo, que se negou a realizar a colocação do dispositivo intrauterino (DIU) em uma mulher devido a questões religiosas.
O caso foi noticiado no dia 24 de janeiro deste ano, depois que a paciente Leonora Macedo contou sobre a recusa da instituição médica nas redes sociais.
A Sociedade Beneficente São Camilo – Hospital São Camilo tem o prazo de 15 dias para se manifestar.
A deputada estadual Andréa Werner (PSB) enviou uma representação para o órgão na semana passada para que fosse aberta a investigação.
A parlamentar declarou que recebeu “com alento” a notícia de abertura do inquérito.
“Quando um hospital particular e um plano de saúde recusam atendimento, o que eles fazem, na prática, é mandar o paciente para o SUS. Isso sobrecarrega o sistema público, enquanto o sistema privado tem autonomia para negar procedimentos, mesmo quando previstos claramente pela ANS”, diz Andréa Werner.
Ainda segundo o documento do MP-SP, a prática noticiada pode afrontar dispositivos constitucionais e legais e, por isso, é necessária a investigação dos fatos pelo Ministério Público.
É informado que “o planejamento familiar decorre dos princípios da dignidade da pessoa humana e da paternidade responsável, e o Estado deve proporcionar os recursos educacionais e científicos para o exercício do direito ao planejamento familiar, sem qualquer forma de coerção”.
O órgão cita uma lei que reafirma que “o planejamento familiar é direito de todo cidadão.”
Além disso, segundo o MP-SP, a negativa de realização de procedimentos contraceptivos pode acentuar indevidas exclusões sociais.
A rede hospitalar tem 15 dias para se manifestar e deve esclarecer se a recusa se aplica aos pacientes encaminhados pelo Sistema Único de Saúde (SUS), particulares e de planos de saúde.
“Deve também informar o nome da pessoa que, nos últimos dias, solicitou a inserção de DIU e que teve o procedimento recusado pelo Hospital São Camilo. Deve informar se essa pessoa solicitou a colocação do DIU por meio do SUS, como particular ou por plano de saúde”, afirma a portaria de instauração do inquérito.
Procurada, as Entidades Camilianas no Brasil, que representam o hospital, disseram manter o mesmo posicionamento da semana passada.
“Informamos que em todas as unidades a diretriz é não realizar procedimentos contraceptivos em homens ou mulheres, exceto em casos de risco à saúde, em alinhamento ao que é preconizado às instituições confessionais católicas.”
Caso de Leonora
Uma médica do São Camilo informou para a paciente Leonora Macedo que não poderia colocar o DIU em mulheres porque isso vai contra os valores religiosos da instituição.
Na ocasião, o Hospital São Camilo SP confirmou que, por diretrizes de uma instituição católica, não há realização de procedimentos contraceptivos, seja em homens ou mulheres.
“Os pacientes que procuram pela Rede de Hospitais São Camilo – SP e não estão com a saúde em risco são orientados a buscar na rede referenciada do seu plano de saúde hospitais que tenham esse procedimento contratualizado.”
Hospital pode se recusar a colocar DIU por questões religiosas?
“Se não há risco para a integridade da saúde do paciente, o hospital privado pode se negar a realizar o procedimento por preceitos religiosos”, afirma Mérces da Silva Nunes, especialista em Direito Médico.
A situação muda quando a vida do paciente está em risco.
“Nesse caso, não há possibilidade de ser invocada, tanto pela instituição como pelos profissionais de saúde, qualquer convicção religiosa com o propósito de evitar a realização de um determinado procedimento. Isso seria inconcebível e o caso seguiria para apuração de responsabilidade na esfera criminal”, disse a advogada.